A Ascensão de Nosso Senhor ao céu é uma antiga celebração que ocorre no quadragésimo dia após o domingo de Páscoa. Santo Agostinho afirmava que essa festa pode ter se originado ainda no período apostólico, conforme leu nos escritos de seus predecessores. Essencialmente, o valor teológico desta solenidade está em ressaltar a conclusão da obra redentora de Jesus na terra.
O evangelista Lucas, tanto nos Atos dos Apóstolos quanto em seu Evangelho, nos ajuda a situar a narrativa bíblica desse acontecimento após a ressurreição de Jesus. Uma leitura atenta desses relatos nos revela algumas razões teológicas para a ascensão física de Cristo ao céu (análisepsia), que merecem reflexão.
Uma das razões está na confirmação da ressurreição corporal. Além da necessidade de retornar ao Pai após completar sua missão salvífica na terra, Jesus precisou ser visto por testemunhas enquanto subia fisicamente às nuvens. Isso confirmou a verdade fundamental da ressurreição: que Jesus ressuscitou com o mesmo corpo com o qual morreu; não era um fantasma ou espírito sem forma, nem fruto da imaginação dos discípulos. A ascensão, portanto, serviu para solidificar a doutrina da ressurreição entre os cristãos, especialmente nas gerações posteriores.
A ascensão também marca o cumprimento da promessa de Jesus: sua partida seria seguida da vinda do Espírito Santo, o Paráclito (cf. Jo 16,7; 14,16.26; 15,26). Ao autenticar a ressurreição e a ascensão de Jesus, o evento inaugura também a missão do Espírito, cuja manifestação decisiva ocorre de forma dramática na festa de Pentecostes (At 2,1-4).
São Paulo, em nossa segunda leitura, refere-se a essa experiência espiritual como “sabedoria e revelação que levam ao pleno conhecimento de Deus”. É o mesmo Espírito que nos abre às riquezas da glória divina manifestada no mistério pascal.
A ascensão possui ainda um valor pastoral, ao atender às esperanças espirituais dos cristãos. Jesus frequentemente falava de uma realidade que vai além do tempo presente: um Reino eterno, distinto da brevidade da existência terrena. Ele se referia também à dimensão de onde veio, enviada por seu Pai.
O Apocalipse descreve esse “lugar” ou “estado de vida” com estas palavras: “Deus enxugará toda lágrima de seus olhos. Não haverá mais morte, nem luto, nem choro, nem dor” (Ap 21,4; cf. Is 25,8; Ap 7,17).
Sem a ascensão, essas promessas poderiam ter permanecido abstratas para os discípulos. Mas ao testemunharem Jesus ascendendo e desaparecendo aos seus olhos, perceberam com clareza que o destino do Mestre era também o deles. Como disse Jesus a Pedro: “Agora, tu não podes seguir-me, mas seguirás depois” (Jo 13,36).
O túmulo vazio e as aparições do Ressuscitado já haviam confirmado suas palavras. Ainda assim, os discípulos talvez se perguntassem: “E agora? O que acontece com nossos sonhos?”. Sua dificuldade em aceitar a ressurreição talvez estivesse ligada à frustração com expectativas não realizadas. A pergunta feita a Jesus em At 1,6 – “Senhor, é agora que vais restaurar o Reino de Israel?” – revela esse anseio.
A ascensão, nesse contexto, foi um sinal claro de que as promessas de Jesus se cumpririam. Os discípulos finalmente compreenderam que todas as experiências desconcertantes de suas vidas ganhariam sentido. Ver Jesus subir foi para eles um momento de iluminação: “Agora entendo o que Ele queria dizer”. Por isso, voltaram a Jerusalém cheios de alegria, louvando a Deus continuamente no templo (cf. Lc 24,52-53).
Nós, cristãos do século XXI, não tivemos o privilégio de testemunhar fisicamente a ascensão do Senhor, mas somos herdeiros da fé daqueles que viram e creram.
Hoje, participamos da herança espiritual de Deus. Embora compartilhemos das fragilidades e dúvidas dos discípulos, nossa fé nos permite contemplar, com os olhos da alma, o Cristo glorioso que sobe ao céu.
Sua ascensão reforça a crença de que, se a cabeça do Corpo Místico sobe ao céu, todo o corpo também há de subir. Nós, que somos o Corpo de Cristo, celebramos essa festa não apenas para reafirmar nossa fé na ressurreição, mas para renovar nossa esperança de que nossa jornada neste mundo – com suas alegrias e sofrimentos – caminha rumo a uma realidade plena e eterna.
“O Senhor se eleva; a graça se derrama”. À medida que Jesus sobe, sobem com Ele nossas esperanças, nossos sonhos e nossas buscas mais profundas. A ascensão do Senhor é, portanto, uma palavra de esperança para todos os que creem.